A minha agenda escondida

Ao preencher um formulário, à mesa de café, não sei responder à clássica pergunta: profissão? Tantas coisas que faço, aparentemente diferentes. Claro, leituras e literaturas. Ensinar a pensar e a sentir, que a nossa civilização nos tem desensinado essas duas artes.

Serão adquiridas naturalmente? Se o fossem, ao ler jornais e ver telejornais, não veríamos o que vemos. Humanos que sabem pensar e sentir com clareza não se organizariam desta forma, digamos, destrutiva. Por isso, talvez não seja fundamental ter uma resposta para a pergunta profissão e seja melhor revelar a minha agenda escondida.

O que me interessa é ajudar a construir uma sociedade mais equilibrada e mais cooperativa, isto é, mais inteligente e sensível. Pensamos que pensamos bem e pensamos que estamos conscientes do que sentimos. Mas abrimos os jornais e vemos o resultado a que chegámos. Não temos tempo para nós, assumimos que o piloto automático sabe conduzir a nossa vida. Não sabe.

Quero uma sociedade melhor e o meu contributo só pode ser ajudar os outros a serem melhores: a conhecerem-se melhor. A terem mais respeito por si e pelo outro, a reconhecer o seu potencial e as suas feridas por curar. A sentir o perfume da sua própria grandeza, sem perder a humildade. Não sou modelo a seguir mas tenho comigo ferramentas para dar a cada um que queira singrar nesse caminho de auto-descoberta e auto-valorização. A partir da leitura, da literatura e seus derivados.

Sim, por vezes estou só a divertir-me, só a divertir os outros. Só a apreciar um momento de beleza, só a ensinar a reparar na liberdade. Mas não se iludam, trago sempre comigo a minha agenda escondida. Portanto, quando digo, com relativa satisfação, que sou mediador de leitura, deveria talvez dizer: sou facilitador de pessoas, criador de ambientes favoráveis, inspirador de talentos adormecidos, enfim, dono de uma agenda escondida com finalidades poético-emocionais: viver na Terra a experiência da verdadeira comunhão com os pares.       

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